Argélia lança operação para resgatar reféns de militantes em campo de gás
Ação militar é confirmada por Reino Unido. Informações indicam que cinco estrangeiros e 600 argelinos foram libertados; ministro reconhece que ataque militar deixou vários mortos
O Exército da Argélia lançou nesta quinta-feira uma
operação para resgatar reféns em um campo de gás natural na desértica
região sul que foi atacado por militantes islâmicos na quarta
, disse o Ministério de Relações Exteriores do Reino Unido.
À TV argelina, o ministro de Comunicações da Argélia,
Mohamed Said Belaid, disse que o Exército lançou a operação quando os
militantes rejeitaram se entregar e tentaram fugir do país com os
reféns. "Um número importante de terroristas foi neutralizado durante a
operação", afirmou. "Infelizmente deploramos algumas mortes e o fato de
haver algumas pessoas feridas. Ainda não temos os números", afirmou
indicando que haveria vítimas entre os reféns.
Previamente, a agência estatal da Argélia
afirmou que quatro reféns estrangeiros - dois da Escócia, um da França e
um do Quênia - e 600 funcionários argelinos foram resgatados. Sem dar
detalhes, porém, a agência acrescentou que a operação deixou várias
vítimas. Citando o Ministério de Relações Exteriores da Irlanda, a rede
de TV BBC disse que um irlandês foi solto e falou com sua família, mas
não está claro se ele foi libertado pela operação argelina.
Os soldados argelinos cercavam
desde quarta os radicais no complexo de Ain Amenas, no Saara perto da
fronteira com a Líbia, que foi ocupado durante um ataque em que um
britânico e um argelino morreram. Além dos dois mortos, seis outras
pessoas ficaram feridas na quarta, incluindo dois britânicos, um
norueguês, dois policiais e um agente de segurança, informou a agência
de notícias estatal do país. O campo de gás é operado pela estatal de
petróleo da Argélia, Sonatrach, juntamente com a petrolífera britânica
BP e a norueguesa Statoil.
À Agência de Informação Nouakchott, rede de
notícias da Mauritânia que divulga informações de grupos extremistas
vinculados à Al-Qaeda, militantes disseram que helicópteros do Exército
atacaram o local, matando 35 estrangeiros e 15 sequestradores. O
porta-voz do Katibat Moulathamine ("Brigada Mascarada"), grupo fundado
por um importante membro da Al-Qaeda no Norte da África que reivindicou a
ação, afirmou que Abou El Baraa, líder dos sequestradores, está entre
os mortos, enquanto sete reféns estrangeiros estão vivos.
Segundo o militantes, o ataque aconteceu quando
eles tentavam deixar o complexo. As informações dos militantes ainda
não foram confirmadas oficialmente. À Reuters, um residente local disse
que há vários mortos pela operação.
O governo do presidente dos EUA, Barack Obama,
disse que ainda não pode confirmar se os reféns americanos estavam vivos
ou mortos.
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, adiou um
importante discurso que faria na sexta-feira na Holanda sobre o futuro
do Reino Unido na União Europeia por causa da crise argelina. "É uma
situação fluida, muito incerta e que ainda está em processo... temos de
nos preparar para mais notícias ruins", disse.
'Retaliação à operação da França no Mali'
Na quarta, os militantes disseram que mantinham 41
estrangeiros como reféns, enquanto o governo argelino afirmava que
haveria 20, incluindo americanos, britânicos, noruegueses, franceses e
japoneses. Os militantes justificaram a ação afirmando que era uma
retaliação à Argélia por permitir que a França use seu espaço aéreo para
lançar ataques
contra grupos rebeldes vinculados
à Al-Qaeda no norte do Mali.
Nesta quinta, o presidente francês, François Hollande,
disse que crise na Argélia mostra que a intervenção francesa no Mali é
justificada. Segundo ele, os acontecimentos pareciam ter tomado um rumo
"dramático", mas que não tinha informação suficiente para permitir uma
avaliação correta da situação.
Previamente à informação sobre a operação para o resgate dos reféns, autoridades e a imprensa local disseram que alguns reféns haviam escapado do local
. Detalhes da fuga e o número de envolvidos não estão claro, mas há
informações de que entre 15 e 20 estrangeiros e entre 30 e 40 argelinos
teriam escapado.
Os agressores mantinham os reféns em uma área
do quarteirão residencial, que as forças de segurança e o Exército
cercaram, segundo o ministro do Interior argelino, Daho Ould Kabila. Uma
fonte da segurança argelina disse que os militantes armados exigiam uma
passagem segura para sair com os reféns.
Reprodução de vídeo fornecida por
grupo de inteligência SITE supostamente mostra o líder militante Moktar
Belmoktar, que liderou sequestro de reféns na Argélia
Porta-vozes dos militantes dizem que eles
divulgaram uma lista de demandas, incluindo o fim da intervenção militar
francesa no Mali. Além disso, afirmaram que os reféns seriam mortos se
soldados tentassem resgatá-los. "Invadir o complexo seria fácil para o
Exército argelino, mas o resultado seria desastroso", advertiu.
O ministro do Interior argelino disse que os
sequestradores são argelinos e operam sob as ordens de Mokhtar
Belmokhtar, um graduado comandante da Al-Qaeda no Magreb Islâmico
desde o fim do ano passado, quando ele montou seu próprio grupo armado
depois de aparentemente ter se indisposto com outros líderes.
*Com BBC, AP e Reuters
http://ultimosegundo.ig.com.br
Entenda os interesses da França no Mali
Operação militar francesa iniciada na sexta tem objetivo de impedir que grupos rebeldes assumam o controle de todo o país e, posteriormente, ameacem a Europa
A ação militar francesa no Mali parece haver rendido
pontos ao presidente da França, François Hollande, nas pesquisas de
opinião, mas muitos analistas se surpreenderam com a intervenção do país
europeu na sua ex-colônia africana.
A operação militar francesa, que teve início na sexta-feira
, tem, segundo Hollande, o objetivo único de impedir que grupos rebeldes
islâmicos que controlam o norte do Mali assumam o controle de todo o
país. Uma força regional, composta por tropas de vários países da África
Ocidental, em poucos dias também estará no Mali para auxiliar nas
operações contra os grupos insurgentes.
Pelos termos de um acordo firmado em outubro, a França
deveria liderar uma missão europeia que daria treinamento com apoio
logístico a uma intervenção promovida pelo bloco militar da Comunidade
Econômica de Estado de África Ocidental (Cedeao). Ou seja, não estava
previsto que a França participaria dos combates.
Hollande tem enfatizado que, se o Mali se converter em
refúgio de insurgentes islâmicos, a segurança europeia estaria em risco.
Mas, além da segurança europeia, o que mais estaria por trás da decisão
francesa de intervir no conflito africano?
Ameaça à Europa
Os rebeldes islâmicos, alguns dos quais teriam ligações com a rede Al-Qaeda
, já controlam metade do Mali, e a chance de que venham a controlar todo
o território do país não é de todo remota, segundo Paul Melly, analista
de temas africanos da BBC. Especialistas concordam que o Exército no
Mali não tem capacidade de conter a ofensiva rebelde.
A captura recente de Konna, o ponto mais ao norte do país
que ainda não havia caído nas mãos dos militantes islâmicos, funcionou
como um grito de alerta. ''Representantes do governo da França não
estavam exagerando quando disseram que, sem a intervenção francesa, os
insurgentes islâmicos poderiam chegar à capital, Bamako, em questão de
dias'', afirma Melly.
De acordo com o analista, isso teria sido desastroso não
apenas para o Mali, mas para toda a África Ocidental, ''ameaçando a
estabilidade e as estruturas democráticas de toda a região''. Isso
também poria em jogo todos os interesses da ex-metrópole francesa, que,
historicamente, sempre teve uma presença importante na região. E seria
preocupante também para a comunidade internacional, segundo Melly.
''Permitir que um país da África Ocidental outrora
estável ruísse completamente diante de grupos cujo objetivo é exportar a
guerra santa seria arriscar a estabilidade e a segurança de várias
nações, do Senegal à Nigéria'', opina o analista.
Intervencionismo francês
A França tem um histórico de intervenções militares em
suas antigas colônias em momentos de insurreições, golpes de Estado e
instabilidade política. O analista da BBC Tim Whewell frisa que a
França, que até os anos 50 e 60 controlava vários países africanos,
''nunca deixou a região por completo''.
'"Mesmo após a independência de suas antigas colônias
africanas, a França já interviu em conflitos no Gabão, na República
Centro-Africana, na Costa do Marfim e na República do Congo."
Então, por que mudou de ideia tão subitamente se seu
plano inicial era apenas fornecer apoio logístico? A resposta do governo
francês é que a própria administração interina do Mali pediu a ajuda
francesa quando os rebeldes avançaram até assumir o controle de Konna,
cidade considerada crucial e situada a pouco mais de 680 km da capital
malinesa.
Impulso a Hollande
Os índices de popularidade do presidente Hollande vinham
despencando, e muitos acreditam que a intervenção favorece a sua imagem.
Até o momento, o líder socialista vinha se posicionando como um
estadista antibelicista, com planos de retirada imediata de tropas
francesas no Afeganistão.
Mas seus índices de aprovação caíram para a faixa de 20%
desde que ele chegou ao poder, no ano passado. E uma pesquisa recente
mostrou que 3 em cada 4 franceses duvida que ele será capaz de cumprir
suas promessas.
François Heisbourg, diretor do Instituto Internacional de
Estudos Estratégicos, baseado no Reino Unido, afirmou que a intervenção
no Mali deu a Hollande um empurrão em um momento difícil para seu
governo.
"Hollande é visto, inclusive por muitos de seus
partidários, como um homem indeciso, como Obama era visto nos primeiros
meses de seu mandato", afirma. ''Sua decisão de intervir no Mali, que
foi rápida, contundente e aparentemente efetiva, mudou subitamente a
imagem de Hollande.''
Aposta de risco
Mas os analistas advertem também que a decisão francesa
representa uma aposta de risco. ''Os rebeldes estão muito bem equipados,
têm grande mobilidade e conhecimento do terreno. A França tem vantagem
aérea, mas os bombardeios podem ser contraproducentes e alienar uma
parte da população civil do Mali'', diz à BBC Nigel Inkster,
ex-agente do MI6, o serviço de inteligência britânico.
Jonathan Marcus, especialista da BBC em assuntos
diplomáticos, afirma que os objetivos da missão francesa são poucos
claros: "O envio de tropas visa a conter o avanço dos rebeldes islâmicos
ou a que o governo do Mali retome o controle do norte do país? Trata-se
de uma área gigantesca'', comenta. Os próprios meios de comunicação
franceses já manifestaram preocupações com a intervenção e destacaram
que ''é fácil entrar, mas difícil sair''.
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